NFS-e Nacional – Painel mostra que 501 municípios ainda não aderiram ao sistema de nota fiscal da reforma

Faltam 15 dias para a fase de testes da reforma tributária do consumo começar, mas 501 dos 5.571 municípios brasileiros ainda não aderiram e se adequaram ao sistema da Nota Fiscal de Serviços Eletrônica (NFS-e) padrão nacional. Só um terço das prefeituras (1.843) está com o programa ativo e operacional, pronto para uso. A adesão é obrigatória desde a Lei Complementar nº 214, de 2025, que regulamenta a reforma.

Prefeituras que não aderirem até 1º de janeiro de 2026 correm o risco de terem as transferências voluntárias de recursos suspensas, como emendas parlamentares, em pleno ano eleitoral. Neste ano, foram R$ 27,6 bilhões transferidos via emendas, segundo o Portal da Transparência.

Sem acesso, empresas e contribuintes dessas cidades não poderão emitir nota fiscal e podem ser obrigados a recolher o Imposto (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Além disso, existem modelos de nota fiscal que ainda não estão disponíveis, como os de saneamento básico e pedágio.

Segundo entidades que representam municípios, a lentidão na adesão se deve a desconhecimento, falta de estrutura ou interesse. Prefeituras também apostam que o prazo será adiado, por causa da demora na aprovação do Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 108/2024, que regulamenta a reforma.

Apenas seis Estados – Rio de Janeiro, Santa Catarina, Goiás, Mato Grosso, Rondônia e Roraima – têm 100% das cidades adequadas ao sistema. As que não implementaram são, em maioria, de pequeno porte, com menos de 50 mil habitantes. Apenas quatro são de grande porte, com população de 107 a 120 mil pessoas. É o caso de Simões Filho, na região metropolitana de Salvador (BA), Santana (AP), Manacapuru (AM) e Bacabal (MA).

A Bahia é o Estado com mais municípios ainda não conveniados: um total de 100, seguido do Maranhão (80), Minas Gerais (67), Paraíba (47) e Tocantins (37). Os dados são do painel “Monitoramento da Adesão dos Municípios à NFS-e”, da Receita Federal, atualizados até ontem.

Existem ainda cidades que já aderiram, mas não concluíram a configuração. São 3.227 localidades – cerca de 58% do total de prefeituras. Nesta fase, é preciso parametrizar os dados do código tribunal municipal à plataforma e inserir os códigos de serviços, as alíquotas e eventuais isenções e benefícios fiscais, dizem técnicos que acompanham o tema.

Na visão do procurador Ricardo Almeida, assessor jurídico da Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais (Abrasf), a falta de cadastramento é, sobretudo, por desinteresse. “Existem muitos municípios que nem deveriam ser municípios no Brasil hoje e são alheios à autonomia tributária, vivem de repasses. Como não têm capacidade financeira e são poucos consumidores, eles não têm interesse nisso ou não é relevante”, diz.

Segundo ele, a atual sistemática de transferências vai ser muito similar a que o IBS vai implementar, mas será centralizada no Comitê Gestor. “Não nos iludimos com uma autonomia de municípios, que não haverá. O Comitê Gestor vai mandar em tudo, porque é inexorável, na medida em que se tem um imposto nacional”, afirma. “Com a centralização, o que a gente vê é um desinteresse de municípios na adesão a esse sistema, que já prenuncia uma crise.”

Almeida diz que os municípios não são obrigados a emitir as notas no sistema nacional – criado pela Abrasf, Confederação Nacional de Municípios (CNM), Receita Federal e outras entidades. Elas podem continuar a intermediação por meio de sistemas internos, mas precisarão repassar os dados ao sistema nacional – de preferência, em tempo real.

O presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, diz que só mil municípios seguem o padrão nacional na emissão das notas. Muitos deles sequer tinham nota fiscal eletrônica ou não informaram corretamente os valores da arrecadação, o que pode comprometer as receitas municipais nos próximos anos. “Tenho alertado muito os prefeitos, mas eles não têm dado atenção a isso”, afirma.

De acordo com Ziulkoski, existe na reforma o chamado Seguro Receita, que visa compensar, por 50 anos, entes federativos que tenham perda na receita com o IBS. Para isso, será necessário apresentar a média histórica da arrecadação de ICMS e ISS dos últimos oito anos, mas nem todos têm esse registro. Esse seguro é um fundo garantidor constituído com 5% da arrecadação do IBS.

“Como as informações não chegaram e centenas chegaram erradas, a população vai pagar por isso, porque ao invés de aumentar a base de arrecadação, diminui, e pode causar um problema orçamentário”, diz. “Fazer a lei é muito simples, agora, como é que executa?”

De acordo com o presidente, a CNM tem feito “caravanas” aos municípios para informar tanto sobre esse ponto quanto sobre a adesão à NFS-e. Esse trabalho também tem sido feito pela Frente Nacional dos Prefeitos e Prefeitas (FNP), diz o secretário-executivo, Gilberto Perre.

Na sexta-feira, foram enviados comunicados a seis municípios com mais de 80 mil habitantes – onde a FNP atua – que não fizeram a adesão à NFS-e. “Se não acontecer até 1º janeiro, dificulta, porque os municípios sofrem os riscos ao não fazê-lo, tanto de perda de arrecadação, quanto de dificuldade que seus contribuintes podem passar”, afirma. “Os empresários que emitem nota fiscal na cidade podem ficar numa situação embaraçosa depois perante o Fisco.”

Mas, na visão dele, já é um sucesso mais de 5 mil terem aderido. “O ritmo de adesão é o que está sendo possível”. Ele acredita que os prazos serão repactuados, pois não estará tudo pronto até 1º janeiro. “É pouco provável, tanto da parte do setor público quanto privado. Então devem surgir novos regramentos durante a fase de transição para saber quando essas penalidades serão impostas ou não”, completa.

Ele orienta que os municípios façam a adesão. “Pode trazer frustração de receitas, porque as receitas daquele município não estarão devidamente registradas. É uma alíquota teste para se entender e medir o que se consegue arrecadar em cada território. Estar fora de uma transição tão importante como essa não é razoável e não é recomendável.”

Em nota ao Valor, o Ministério da Fazenda diz que a adesão de mais de 5 mil municípios é um “avanço”, fruto de um trabalho conjunto entre entidades. “Com mais de 90% dos municípios brasileiros já conveniados, restam cerca de 500 adesões para se atingir à totalidade e evitar que o município seja sancionado, conforme o art. 62 da LC nº 214/2025”.

A Receita, também em nota, afirma que as adesões continuam e estima que a meta será alcançada este mês. “O trabalho de conscientização permanece, agora a partir de contatos pontuais e diretos com municípios ainda não conveniados.”

Em 2026, contribuintes que não destacarem corretamente a CBS e o IBS na nota ficarão sujeitos ao pagamento da alíquota teste de 1%.

https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2025/12/16/painel-mostra-que-501-municipios-ainda-nao-aderiram-ao-novo-sistema-de-nota-fiscal.ghtml

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