Por Estevão Taiar
As médias e grandes empresas do Brasil tinham colocado em prática, na reta final deste ano, apenas 10% das ações necessárias para se adequarem à etapa de transição da reforma tributária sobre consumo, que começará em 1º de janeiro. É o que mostra levantamento da consultoria tributária Tax Group, que ouviu 331 empresas sobre o tema.
Segundo a consultoria, a demora pode trazer problemas para as empresas em frentes como: planejamento de investimentos; administração de dívidas; desequilíbrios em contratos de longo prazo; descompassos entre pagamentos de tributos e aproveitamento de créditos. A transição da reforma tributária termina em 2033.
“É um cenário de maturidade muito baixa na preparação para a reforma”, diz o CEO do Tax Group, Luis Wulff. “Diversas empresas ainda não tinham iniciado as ações ou estavam apenas em um estágio muito, muito preliminar.”
A reforma tributária sobre consumo unifica o IPI, o PIS, a Cofins, o ICMS e o ISS em um novo tributo e uma contribuição: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Mas o novo cenário exigirá das empresas uma série de adaptações, que vão desde mudanças em seus sistemas digitais até a adoção de novos modelos de contrato.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já afirmou que, por causa da magnitude das alterações, o sistema digital criado pelo governo federal para lidar com a reforma será 156 vezes maior do que o do PIX.
O levantamento da Tax Group analisou a preparação das empresas em cinco frentes que serão afetadas pela reforma: fluxo de caixa, contratos, compras, preços e adequação de sistemas contábeis. Entraram no levantamento companhias com faturamento anual acima de R$ 15 milhões, que operam atualmente nos regimes de lucro real e presumido.
Atraso pode sair caro por ter potencial para afetar o caixa, gerar riscos fiscais e perda de competitividade.”
Foram escolhidas empresas para as quais o Tax Group prestou algum serviço ao longo dos últimos cinco anos, mas a consultoria excluiu aquelas com as quais, no momento do questionário, trabalhava em algum projeto ligado à reforma tributária.
Entre as companhias ouvidas, somente 10,3% das ações necessárias, nas cinco frentes, tinham sido colocadas em prática para o início do período de transição. Outras 24,2% iniciativas estavam em andamento, enquanto 65,4% das ações não tinham sido colocadas em prática pelas empresas.
O levantamento mostra que, entre as cinco frentes, aquela cujas iniciativas estavam mais avançadas era a adequação de sistemas. Foi a única em que mais da metade das ações necessárias já tinham sido implantadas ou estavam em implantação. Nas demais, “o quadro é de forte atraso”.
“Em outras palavras: o mercado já entendeu que terá de mexer em tecnologia, mas ainda não internalizou, na mesma intensidade, os impactos econômicos e comerciais da reforma”, diz o estudo.
Para a Tax Group, sem as mudanças necessárias, “contratos de longo prazo podem se tornar economicamente desequilibrados quando novas alíquotas e regras de crédito entrarem em vigor, gerando disputas ou necessidade de renegociação às pressas”.
A consultoria também enxerga riscos em pontos como aproveitamento de créditos tributários, escolha de fornecedores, classificação fiscal de insumos e repasse adequado de preços ao consumidor.
Carlos Thadeu de Freitas, assessor de economia da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), concorda que a reforma “é muito complexa e mexe em várias áreas ao mesmo tempo”. “O problema é que esse atraso [das empresas] pode sair caro, já que tem potencial para afetar o caixa, gerar riscos fiscais e até mesmo perda de competitividade”, diz.
Elisa Henriques, sócia da área de consultoria tributária do Velloza Advogados, avalia que uma série de fatores, ao longo da implantação da reforma dificultaram a preparação das companhias. Exemplos são a demora pela Receita Federal na publicação de orientações a respeito do preenchimento de documentos como Declaração do Regime Específico, falta de regulamentação da Lei Complementar nº 214/2025, que cria o IBS e a CBS, e a aprovação apenas em dezembro do Projeto de Lei Complementar 108/2024, que cria o Comitê Gestos do IBS e da CBS. “Não tem um motivo único”, diz. “Foi uma sequência.”
Em nota, o Ministério da Fazenda afirma que a transição foi desenhada “para permitir que empresas e administrações tributárias se preparem de forma gradual, com previsibilidade” e que publicará “orientações à medida que o processo legislativo e regulatório avance”.
A pasta destaca que no dia 22 publicou “ato com orientações iniciais sobre obrigações acessórias, deixando claro que não é possível avançar na regulamentação completa antes da sanção do PLP 108. E acrescenta que o ato estabeleceu que até “o primeiro dia do quarto mês subsequente à publicação da parte comum dos regulamentos do IBS e da CBS, não haverá aplicação de penalidades pela ausência de registro dos campos do IBS e da CBS em documentos”.