Por Igor Alves
A reforma tributária prevê adesão optativa aos novos tributos por parte das empresas do Simples Nacional. Ocorre que esta opção afeta diretamente os demais elos de uma cadeia comercial. A questão que se coloca é a análise a ser feita segundo os diferentes pontos de vista dos envolvidos para tomada de decisão da opção aqui tratada.
Mudanças inquietam, sobretudo quando falamos de tributação. Se de um lado a ideia é manter a carga tributária, de outro alguém isoladamente considerado vai pagar a conta, na medida em que a tributação de consumo deve desonerar a produção e mais igualitariamente tributar a todos.
Tanto quanto necessária, a reforma tributária é uma mudança complexa que requer especial atenção. Formalizada pela Emenda Constitucional 132/2023 e regulamentada pelo PLP 68/2024, introduz-se relevantes mudanças estruturais no sistema tributário brasileiro.
Entre outras inovações, o novo sistema tributário substitui as contribuições do PIS e da Cofins, além do problemático ICMS e o ISS, pelo Imposto Sobre Valor Agregado (IVA) dual, composto pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).
Embora as alterações sejam significativas, o discurso seria de que nada mudaria para empresas do Simples Nacional. Na prática, porém, as mudanças exigem atenção.
É bem verdade que o regime do Simples Nacional, instituído pela Lei Complementar 123 de 2006, pouco foi alterado. O recolhimento, que hoje reúne basicamente todos os tributos devidos pela empresa em uma única guia, se manterá apenas com as devidas substituições do PIS, Cofins, ICMS, E ISS, pelo IBS e CBS, tudo com a promessa de que a carga tributária do regime não será alterada.
A neutralidade do Simples Nacional para fins da reforma, contudo, é apenas aparente. O IBS e CBS são não cumulativos, de tal sorte que a cadeia de suprimentos se creditará do IBS e CBS incidente nas compras realizadas. A empresa do Simples, contudo, é exceção no novo regime e gera apenas um crédito bastante reduzido para o cliente.[1]
Como resultado, determinados clientes podem optar por se abastecer de empresas que estejam no Lucro Real ou Lucro Presumido, em detrimento das empresas do Simples, que arriscam perda de mercado.
Sendo assim, o novo regime criou a opção de apurar o IBS e a CBS “por fora” do Simples Nacional. Isso quer dizer que as empresas se manterão no Simples, recolhendo os demais tributos normalmente em guia única, com alíquotas reduzidas como é hoje, mas recolherão o IBS e a CBS “por fora”, como se estivessem no regime comum. Aumenta a carga tributária, mas viabiliza o crédito “cheio” ao adquirente que não consumidor final.
Ao passo que resolve a questão do repasse de créditos às empresas adquirentes, o regime híbrido pode trazer outras dificuldades, como, por exemplo, a complexidade de operar dois regimes ao mesmo tempo, além da dificuldade de operacionalização contábil das apurações mais complexas por fora do Simples, a necessidade de investimentos em sistemas, dentre outros desafios que podem destoar da simplicidade do sistema atual.
As empresas abastecidas por outras empresas do Simples Nacional precisam trazer seus fornecedores à mesa e assegurar a melhor adequação do novo sistema em seus interesses. Isso inclui um trabalho de educação desses fornecedores, que podem não se atentar aos impactos trazidos pela reforma, tudo com o objeto de evitar não apenas a mudança de parceiros, mas também distorções de preço que certamente ocorrerão caso não seja dada a devida atenção à nova forma de cálculo dos tributos sobre cada produto.
Adequar-se ao novo sistema será crucial para não perder mercado, em especial para empresas do Simples inseridas no meio da cadeia, já que não há que se falar em crédito nas vendas ao consumidor final.
Digno de nota que há no Congresso projeto de emenda à constituição para conceder, também às empresas do Simples Nacional, a possibilidade de apropriação de créditos integrais de IBS e CBS. Tais projetos, contudo, esbarram na consequente queda da arrecadação, cuja compensação estima-se que elevaria a alíquota geral de 28 para 30%.
[1]Art. 28. O contribuinte sujeito ao regime regular do IBS e da CBS poderá apropriar créditos desses tributos quando ocorrer o pagamento dos valores do IBS e da CBS incidentes sobre as operações nas quais seja adquirente de bem ou de serviço, excetuadas exclusivamente as operações consideradas de uso ou consumo pessoal e as demais hipóteses previstas nesta Lei Complementar.
§ 10. Na hipótese de o recolhimento do IBS e da CBS ser realizado por meio do Simples Nacional, quando não for exercida a opção de inscrição no regime regular de que trata o § 4º do art. 21 desta Lei Complementar:
I – não será permitida a apropriação de créditos do IBS e da CBS pelo optante pelo Simples Nacional; e
II – será permitida ao contribuinte sujeito ao regime regular do IBS e da CBS a apropriação de créditos do IBS e da CBS correspondentes aos valores desses tributos pagos na aquisição de bens e de serviços de optante pelo Simples Nacional, em montante equivalente ao devido por meio desse regime.
https://www.jota.info/artigos/impacto-sistemico-da-reforma-tributaria-no-simples-nacional